quarta-feira, abril 18, 2007

Mau Olhado

pois é....pois é....todos conhecemos bem "os ciganos" e a visão menos boa que, provavelmente, a maioria da nossa sociedade tem dos mesmos. Até ao momento, e sendo a minha vida de médico bastante curta (se é que o sou já), a experiência que tenho tido com estas pessoas até é bastante agradável, apesar de conhecer inúmeras histórias menos afortunadas, algumas das quais, inclusivamente, com finais trágicos. São pessoas preocupadas pelos seus familiares (a tal ponto que entram todos pela urgência a dentro sem que nada os pare...isto era um aparte)....se se trata de um menino, normalmente o pai acompanha sempre a mãe, mostrando-se interessado no problema da criança, querendo saber quais os medicamentos que são prescritos e a sua correcta administração...pois é....pois é.....enquanto fiz o meu curso em terras espanholas, fui algumas vezes abordado ou via cenas na rua destas pessoas, e pude observar e escutar inúmeras vezes falar em mau olhado....porque se não paga os 20 euros pela leitura da mão lá vai o mau olhado...porque se o marido foi infiel lá vai o mau olhado....enfim....aliás, nem é preciso ser-se cigano para dizer que alguém tem um mau olhado......pois é....pois é.....desta vez, e para não variar, a situação passa-se na urgência. Dois pais novos, com o seu rebento de 3 anos, e com ela à espera do 2º filho. Lá entraram, com muita licença e educação.....é o olho doutora....pôs-se assim....tá tão vermelho aqui à volta....e tem também pus.....pois....a doutora mal viu aquilo fez logo o diagnóstico de conjuntivite....e lá foi explicando....os pais esses lá olhavam pra nós e para o menino....tentavam perceber como se aplicavam as pomadas e outros medicamentos......e escutavam atentamente as ordens da dra. para a não propagação da doença a outros elementos da familia ou a eles próprios.......cuidado para não tocar porque isto passa de um olho de uma pessoa para outra e tal e qual.....fez-se um silêncio na consulta.....o pai olhava sério como a tentar perceber aquela última informação.....e eis que salta...."Então sôtora, se a gente ficar muito tempo a olhar para o olho dela também ficamos com aquilo não é?"....isto minha gente....é o verdadeiro mau de olhado....

segunda-feira, abril 16, 2007

É melhor ir dar uma volta

pois foi....ai está a minha primeira expulsão da consulta de urgência de pediatria. Estava eu muito bem disposto, à espera de uma menina de 14 anos que a dra. já tinha chamado, quando me apercebo de uma pseudoadulta, vestida com um traje pouco discreto, algo tímida nada mais passar a porta. .....olá, diz a dra. outra vez por aqui? continua. Pois, é q me doi ao fazer xixi, diz entre dentes, enquanto a observo discretamente....deve ser outra infecção urinária.....então vais fazer xixi neste frasquinho e depois trazes cá....ela saiu mais timida ainda pois foi-lhe dito para se lavar antes do xixi....ela já tem cá vindo....já vive com um rapaz....também é cigano....dra. e se lhe pedisse um teste de gravidez.....sim sim já não era a primeira vez.....eu penso que ela vem cá para isso....ela chega entretanto.....leva uma das mãos à cara, escondendo o rosto da minha visão de forma a que só a médica a percebesse.....tensão.....vermelhidão dupla (a da cigana e a minha)....oh colega se calhar é melhor que saia.....mas olhe que ele é médico......pois......lá saí.....enquanto saía....ria-me entredentes.....e dizia para mim: isto realmente....ainda bem que leio os blogs, assim sei q não sou o unico....um dos enfermeiros ao aperceber-se da situação.....pois é dr., você pode ser médico...mas ela....ela é cigana....e rimo-nos obviamente.....mas pensei também, e para além da sua etnia,que só tinha 14 anos....mais tarde voltei à consulta, e lá me contou a dra. que havia história de enjoos e um ingurgitamento mamário.....o teste, mais tarde, deu negativo (claro que a sensibilidade deste teste não é de 100% , mas enfim......por agora é negativo).....e foi assim que fui expulso pela primeira vez da consulta.

PS: esta história, para além de engraçada para mim, é apenas uma história de uma pessoa do sexo feminino de etnia cigana com os seus valores e crenças. Penso ser minha obrigação, como médico, esclarecer os doentes sobre as verdades das doenças e tentar afastar algumas aprendizagens erróneas, mas a vontade do doente prevalece sobre a minha vontade própria, sendo então minha tarefa por ao dispor do doente os meios para que este possa ser atendido, curado ou aliviado. Nesta situação só foi preciso sair da sala.....

domingo, abril 08, 2007

As festas de aldeia

Pois é, não primo pela regularidade da escrita, e isso que até tenho algumas histórias engraçadas para contar, mas enfim, ando numa de preguiça....
Acabo de chegar do tipo bailarico à moda antiga.....e de tão antiga que é a moda, também antigo era o senhor que cantava....toda a gente o conhece...com o seu ar calmo e sereno, o sorriso disfarçado mas sempre presente, ali estava ele, mais um ano, pronto para dar musica com o seu acordeão e o seu orgão 1001 funções. A idade essa não perdoa, mas contam os mais velhos que era ele que sempre animara as festas daquele então, uma época onde se namorava às escondidas, uma época onde se faziam mais de 10 km a pé para poder ir ver as moças das outras povoações....e hoje ali estava ele, para não deixar esquecer a memória de um passado desconhecido para nós e lembrado com saudade por outros.... Pró orgão bastava uma mão, a direita....lá punha um ritmo em background e lá tentava trotear com o orgão alguma que outra musica, enganado-se de nota com alguma frequência, sem que isso o importunasse....o que interessava é que no meio desta vida pacata e rotineira, ele continua a sentir-se diferente....uns momentos depois, algumas valsas mal tocadas pelo meio, e lá q passa para o acordeão....esse sim parece ser a sua continuação...uma destreza impressionante para alguem com mais de 80 anos....no cimo do acordeão, um microfone.....e lá troteava, num som ritmico, acompanhado por um acordeão que não vacilava.....ele sozinho no palco, o orgão, o acordeão e duas colunas, uma a cada lada.....os miudos corriam.....uns subiam para o palco....os graudos esses dependia....as mulheres aos pares dançavam.....os homens esses bebiam, na tão famosa moda da "mini" de aldeia.....e ele ali continuava.....sozinho.....sorria...o acordeão acompanhava...movimentos certos e vagarosos....sem pressas....só ele, no meio da rotina alheia....e sorria....e eu.....eu...observava...afinal....não estava sozinho....
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